Ermegildo tornou-se num ermita refugiado
em paredes de amargura. Muros altos que sobrepunham a luz do dia e o entregavam
a uma existência penitente de dias que se repetiam sem qualquer outra coisa que
não um existir pesaroso, vazio e sem ambição nenhuma. Os anos passaram e
sucumbiu à passagem do tempo como se este fosse adubado em negrume que lhe
toldou o passo vagaroso. Tornou-se velho. Nunca teve amigos e agora afundara
ainda mais numa existência virada ao umbigo, ao seu próprio muro de lamentações
que nunca chegavam a ser afirmação consciente da rebeldia libertadora de um “ai”.
Apenas uma nuvem, sempre presente, augúrio desprovido de qualquer intenção que
renunciasse ao sofrimento.
Deixara de usar meias porque não se conseguia
dobrar o suficiente para as calçar e reduzira os movimentos ao indispensável
para a sobrevivência que teimava em prolongar. Comia papas de aveia, bebia café
e ganhara um cheiro a velho que se confundia com o cheiro da própria casa.
Ouviu a campainha com desconfiança e
surpresa. Nunca abria a porta, mas desta vez o som estridente prolongava-se
numa insistência que anunciava a teimosia entranhada de uma mula. Arrastou-se
devagar e deu passagem aos serviços da segurança social que numa quarta feira chuvosa
de Março o declararam irremediavelmente “pessoa dependente e incapaz de
garantir o seu próprio bem-estar”. Teve vontade de os mandar à merda mas, ou
porque não tinha forças ou porque se estava realmente a marimbar, aceitou
resignado a visita de uma funcionária que viria todas as manhãs para o ajudar
nas tarefas domésticas e “arejar o mofo instalado”.
Foi assim que a conhecera.
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